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Pacificação

Algum tempo atrás uma pessoa me disse toda feliz que estava grávida! E, na empolgação, falava dos desafios, dos preparos, da preocupação com as despesas e que o sonho do pai era que o filho fosse veterinário ou agrônomo para tocar os negócios da família que futuramente iria herdar.


Fiquei pensando sobre as idealizações que fazemos sobre um ser que ainda nem nasceu e como projetamos nossa sensação de mundo nos futuros rebentos ou nos nossos filhos e filhas em geral.

Logo após, uma semana depois, conversando sobre as perspectivas e expectativas que pais e mães fazem sobre os filhos, com uma pessoa que gosto muito de conversar, ela me mostrou uma foto de Tenzin Gyats, o atual Dalai Lama, quando ainda criança, bem pequeno, sendo entronizado como o futuro líder do budismo tibetano, e hoje é umas das grandes vozes pacificadoras do planeta.


Como poderia a família ter tanta certeza?

Claro que é uma cultura diferente e que ele representaria o ideal do sagrado para aquele povo, e que provavelmente qualquer família gostaria de ter um filho que fosse se tornar o Dalai Lama, líder máximo religioso do sistema budista do Tibete e que naquele contexto também incluía poderes políticos, etc....

Mas e na nossa sociedade?

Só vejo as pessoas planejarem que os filhos/filhas sejam os/as melhores, sejam competitivos (nesta época pós Olimpíadas então!), serem prósperos (ricos mesmo!), lindos/lindas e que de alguma forma se destaquem em nossa sociedade como "campeão".

Quando vejo uma sociedade como a que temos, em que as mensagens de amor, de perdão, de superação das diferenças e da capacidade de separar os ataques que se sofrem da pessoalidade têm pouco efeito, entendo perfeitamente de onde tiramos a ideia de que precisamos ser competitivos constantemente. E, se a sociedade não nos incluiu, vamos competir de qualquer modo, mesmo que seja pela via da marginalidade.

Entendo quando não nos esforçamos em nada para superar as dificuldade e somos facilmente influenciados por comentários negativos, por maledicências, por fofocas e ainda valorizamos muito mais o "negativo" do que o "positivo".

Entendo quando aquela mensagem pacificadora e que nos incentiva a superar, a não ser hostil, a perdoar, mesmo não amando, não tem tanto efeito.

Entendo quando uma mensagem de amor não nos atinge com a mesma intensidade do que uma mensagem de ódio e não a levamos para a vida prática, mesmo que achemos uma mensagem linda. Mas a mensagem de ódio, que alguém nos contaminou (muitas vezes intencionalmente para atingir outra pessoa e nos usa), é tão intensa que vai desembocar em ações práticas. As mensagens amorosas e pacificadoras são tão difíceis de se praticar.

Entendo um monte de coisa quando vejo que não temos uma educação pacificadora.

Entendo um monte de ações quando vejo que nossa sociedade não nos educa para amar, mas para competir, no sentido mais negativo da palavra. A competição pode até ser saudável, quando não vem imbuída de ódio ou de tentativa de desvalorizar o resultado que a outra pessoa conseguiu, mesmo que seja bem inferior ao meu. Mas na nossa sociedade você tem que ser "o melhor" não uma pessoa melhor.

Entendo a necessidade que as pessoas têm em promover a discórdia, pois assim, de alguma forma, se sentem no controle de uma situação.

Entendo a necessidade de pessoas disseminarem ideias negativas sobre as outras e criarem "grupos" para se sentirem pertencentes, mesmo que o que os vincule não seja um ideal nobre.


Idealizar é um desafio.

Reclamar da nossa sociedade é fácil.

Fazer um mundo onde cada ser possa ser o que é, sem ter que sofrer nem gerar sofrimentos, também não é fácil.

Ter uma filha ou um filho nesta sociedade que construímos não é fácil.

Não é fácil para pais e mães doarem o que não têm.


Não tem nada de errado em querer uma realização para nosso filho ou nossa filha, dentro daquilo que consideramos valoroso. Mas o que não se pode fazer é excluir outras expressões de valor, além daquelas que são resultados da competição social que adotamos, onde poucos são beneficiados e a grande maioria serve para manter o status quo de uma minoria.

Se alguém não conseguiu ser "bem sucedido" nas áreas materiais e cumulativas de bens, parece que "deu errado" na vida.


Se não formos conscientes de nós mesmos e assumirmos o nosso papel para fazer o mundo pacífico, justo, compartilhado, com oportunidade para todas/todas e respeitoso, vamos reproduzir o olhar social competitivo ao extremo, onde uma fé diferente da minha, uma orientação sexual diferente da minha, uma origem (étnica ou geográfica ou social) diferente da minha, onde uma compleição física diferente da minha, onde uma estrutura física e/ou mental diferentes da minha são motivos tanto para embate como para tentativas de dominação, a partir dos conceitos dominantes que adotamos, muitas vezes até sem percebermos. Desejo uma geração de bebês humanos pacificadores, justos, honestos, respeitosos, capazes de conviver com as diferenças e que sejam, acima de tudo, capazes de produzir bens e valores sem ter que competir no sentido de eliminar os seus contemporâneos ou se sentirem felizes em conseguir algo. Mesmo que falte para outrem, mesmo que vivam com mais fé e menos religião (no sentido institucional da palavra); que não visem somente tronos ou destaques, mas que se sintam realizados com um mundo mais equânime. Que os adultos se sintam felizes se seu filho ou filha, ou sobrinho, ou amigo, ou vizinho expressarem o desejo de viver em função do coletivo e respeitando a diversidade, mesmo que "isto não dê dinheiro". Que eu e você sejamos realizados e plenos de acordo com o nosso desejo de viver, e sem gerar desequilíbrios nem dor deliberadamente. Que sejamos capazes de produzir alimentos de maneira sustentável e com segurança alimentar para todos os povos, respeitando suas particularidades e traços culturais...

Enfim, desejo que nós, já nascidos e nascidas nesta dimensão, e os que nascerão aqui sejamos de fato plenos como seres, independente das escolhas que fizermos, e possamos garantir que a mesma plenitude e garantias que desejamos pra nós, seja para todas e todos.


É o que desejo.

Tata Ngunz'tala 61- 8124.0946 - Vivo 61- 82955346 - TIM

"Ser luz, é atrair as escuridões"


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